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As Colossais Distâncias Cósmicas

05/02/2012
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Quando criança, eu costumava passar as férias es­colares na então tranqüila ilha de Itamaracá, no estado de Pernambuco. Os habitantes locais vi­viam em vilarejos muito pobres e obtinham seu sustento principalmente da pesca. O filho de um pescador, Duda, estava entre meus companheiros de brincadeira. Naquela época, o ensino fundamental já era oficialmente obriga­tório, mas Duda, de dez anos, havia abandonado a esco­la. Por causa disso, ele, assim como a maioria dos ilhéus, vivia imerso num oceano de superstições. Eu sabia desse triste estado de coisas porque já me entusiasmava por astronomia e conversava com eles sobre os objetos ce­lestes. Duda era uma amostra representativa da visão de mundo predominante em Itamaracá. Suas crenças, por sinal, guardavam uma notável semelhança com as de al­guns povos antigos, como os gregos. Para eles, as estrelas eram pequenas luzes coladas no céu, a uma distância tal­vez não muito maior do que a que um avião podia voar. Quando eu dizia que astronautas já haviam caminhado sobre a Lua, ele respondia com um Varêi!, interjeição que mistura espanto e desaprovação usada apenas pelos ita­maracaenses, e afirmava que a Lua era território reserva­do a Deus. Portanto, eu cometia uma blasfêmia ao dizer que nosso satélite havia sido visitado.

Eu me divertia com essas opiniões inocentes e errôneas. Mas se tentarmos por um momento descartar tudo o que aprendemos e apenas observarmos o céu a olho nu, ele se apresenta exatamente como certas culturas pré-científicas o descrevem. As estrelas se parecem mesmo com luzinhas, todas elas mais ou menos à mesma distância de nós, fixa­das a uma espécie de esfera invisível que nos rodeia. Para mim, era uma sensação maravilhosa saber a verdade: as estrelas não são luzinhas, mas sim gigantescas bolas de gás incandescente tão grandes quanto o Sol, algumas pos­sivelmente contendo planetas e seres inteligentes olhan­do em nossa direção e se perguntado se por aqui haveria alguém (nenhum planeta extrasolar havia sido descober­to até então. Hoje, os astrônomos sabem da existência de milhares deles).

Desde a antiguidade já se conheciam indícios de que os planetas e o Sol estavam muito distantes. Em torno de 250 AEC (antes da era corrente), Aristarco de Samos em­pregou um engenhoso método para deduzir que o Sol era bem maior que a Terra (ver quadro ao lado).

Isso o levou a propor o modelo heliocêntrico pela primeira vez. No século XVI, ainda antes do telescópio, o astrôno­mo dinamarquês Tycho Brahe utilizou instrumentos de precisão inventados por ele para determinar as posições exatas dos planetas no céu, o que permitiu que seu suces­sor, o alemão Johannes Kepler, calculasse suas trajetórias e posições relativas em torno do Sol. As distâncias reais, no entanto, só foram calculadas no século XIX, quando a separação entre o Sol e a Terra foi finalmente medida observando-se passagens do planeta Venus na frente do Sol. As distâncias até as estrelas também só se tornaram conhecidas no século XIX, com a medição da primeira pa­ralaxe estelar (ver quadro ao lado). Infelizmente, em pleno sécu­lo XXI, esse conhecimento ainda é pouco difundido, mesmo em socie­dades afluentes.

Viagem Demorada

O que se descobriu é que as distân­cias até as estrelas são imensas. A es­trela mais próxima de nós (depois do Sol, é claro), apropriadamente chama­da Próxima Centauri, está a cerca de 40 trilhões de quilômetros de distân­cia. Pronunciar um número tão gran­de é fácil. Compreendê-lo adequada­mente não é tão simples. Para colocar os valores envolvidos em perspectiva, imagine-se viajando de carro até uma cidade próxima, a 100 km de distân­cia. Numa boa estrada, esse percur­so leva em torno de uma hora. Essa mesma distância é coberta em pouco mais de doze segundos por uma es­paçonave em órbita da Terra. Rodan­do dia e noite, sem parar, a 100 km/h, o carro levaria 158 dias para percorrer 380 mil quilômetros, distância equi­valente à da Lua (se bem que, tipi­camente, um carro demora cerca de vinte anos, se durar todo esse tempo, para atingir tal quilometragem). Essa mesma distância foi percorrida em pouco mais de 8 horas pela sonda New Horizons, que se dirige a Plutão, em 2006. A New Horizons continua a acelerar; sua viagem até Plutão deverá durar nove anos. Plutão está em média 15 mil vezes mais afastado de nós que a Lua. Um dado sem dúvida impressio­nante, mas insignificante comparado à distância para Próxima Centauri. Essa estrela está mais de 105 milhões de ve­zes mais distante que nosso satélite, e a New Horizons levaria quase oitenta mil anos para chegar até lá! Diante disso, vale lembrar que as primeiras civiliza­ções humanas, como a sumeriana e a assíria, e os primeiros registros escritos, datam de “apenas” 6 mil anos. Utilizan­do o melhor de nossa tecnologia atual, viajar para Próxima Centauri – de prefe­rência um percurso de ida e volta – le­varia 26 vezes mais tempo do que toda a história humana desde a invenção da escrita (ver quadro ao lado). É desne­cessário dizer que um projeto com esse objetivo, no momento, é inviável. Além do tempo gasto, há outras dificuldades ainda mais intimidantes (ver “Missão Impossível?”, SCIENTIA, Edição 8). É pro­vável que seres humanos, pelo menos na sua forma atual, nunca deixem a vi­zinhança de nossa estrela, ao contrário do que levam a crer inúmeros contos de ficção científica.

A distância até Próxima Centau­ri, por sinal, é só o começo de nossa progressão. Ela é na verdade minús­cula comparada com as dimensões de nossa galáxia e do Universo como um todo. Se nossa galáxia fosse vista de longe, o Sol e Próxima Centauri es­tariam praticamente no mesmo lugar. Pensemos agora na coisa mais rápida que existe no Universo: a luz. Um fei­xe de luz vai da Terra à Lua em pouco mais de um segundo e leva apenas quatro anos para ir até Próxima Cen­tauri. Esse mesmo feixe, se apontado em direção ao centro de nossa galá­xia, demoraria 26 mil anos para che­gar lá. Para atingir a borda oposta à nossa na galáxia, ele demoraria quase 100 mil anos viajando.

A galáxia mais próxima da nossa, excluindo-se galáxias satélites como as Nuvens de Magalhães, é a de An­drômeda, que os astrônomos acredi­tam ser semelhante à Via Láctea (ver figura ao lado).

Se apontássemos um feixe de luz na direção de Andrôme­da, ele chegaria lá depois de ter viajado por 2,3 milhões de anos. Completando a progressão de distâncias que se ini­ciou com a Lua, em relação ao Universo observável – mais sobre isso adiante – a Via Láctea e Andrômeda estão pratica­mente encostadas uma à outra. Se o Universo visível tivesse uma extensão comparável à do Brasil, as duas galáxias em questão estariam localizadas não apenas na mesma cidade, mas no mes­mo quarteirão (ver quadro ao lado). Há galáxias muito mais distantes que Andrômeda e a luz precisa viajar por bi­lhões de anos para chegar até elas.

Portanto, há enormes espaços vazios entre as estrelas e também entre as galáxias. E o número de estrelas no Universo é, como vários livros de po­pularização científica nos lembram, maior que o número de grãos de areia em todas as praias da Terra. O Univer­so contém centenas de bilhões de ga­láxias, cada qual reunindo centenas de bilhões de estrelas. Nenhum mito de criação humano jamais chegou se­quer longe de descrever o tamanho real do Universo.

Diálogo Interplanetário

A vastidão do cosmos tem impli­cações bizarras. Imagine-se conver­sando com um astronauta em Mar­te, quando este planeta se encontra próximo ao nosso (quando os dois astros estão “do mesmo lado” em suas órbitas em torno do Sol). Ao mesmo tempo em que conversa, você o ob­serva andando sobre o planeta ver­melho através de um telescópio ultra­-potente. Você saúda o astronauta, mas percebe que ele continua suas tarefas como se não tivesse ouvido nada. Você tenta novamente chamar sua atenção. Tenta repetidas vezes, mas nenhuma reação. Frustrado, você desiste de contatá-lo, mas con­tinua observando o que se passa lá longe. Aparentemente, houve algum problema com seu aparelho de rádio. Oito minutos depois você se surpre­ende com o som e a imagem do as­tronauta respondendo, com irritação, a seus repetidos chamados. Agitado, você se desculpa e tenta prosseguir a conversação, perguntando sobre a temperatura em Marte. Porém, o as­tronauta novamente parece ignorá­-lo. Depois de algumas repetições desse comportamento estranho, você conclui que é possível dialogar com seu interlocutor distante, mas por algum motivo ele só responde às suas perguntas oito minutos depois que elas são feitas. Meses depois, Mar­te se encontra mais distante da Terra e você decide iniciar outra comuni­cação com o astronauta. Desta vez, já acostumado com essa estranha pro­priedade das conversas radiofônicas com Marte, você espera os oito minu­tos por uma resposta, mas não ouve nada. A resposta finalmente chega, mas somente depois de vinte minu­tos. Intrigado, você arrisca uma hipó­tese para explicar esses acontecimen­tos. Provavelmente, sua imagem e voz levam alguns minutos para viajar até Marte, e qualquer resposta de Marte leva mais alguns minutos para chegar até a Terra. Ao dialogar, o tempo entre uma pergunta e sua resposta é igual ao necessário para a pergunta, e em seguida a resposta, viajarem entre a Terra e Marte. Além disso, esse tempo varia conforme muda a distância entre os planetas. Ao observar o astronauta ao telescópio, você não está vendo o que ele está fazendo agora, mas o que ele fazia há quatro minutos. Por isso ele não responde imediatamente.

Você finalmente conclui que qual­quer tipo de informação demora um tempo para ir de um lugar para ou­tro. Assim como, no passado, uma caravela levava meses para cruzar o oceano e trazer a notícia da morte do rei e da ascensão do príncipe her­deiro ao trono – e nesse ínterim as pessoas na colônia agiam por meses como se o rei ainda estivesse vivo – as comunicações com Marte, mesmo dispensando caravelas e sendo “dire­tas”, demoram a se efetuar. Depois de perguntar algo ao astronauta distan­te, ele continua atuando por alguns minutos como se não soubesse que a pergunta foi feita. Você suspeita que esse efeito aconteça também quan­do nos comunicamos na Terra, porém de maneira muito mais sutil e prati­camente imperceptível. Normalmen­te, as comunicações entre duas pessoas parecem ser “instantâneas”. Elas são assim porque nosso intercâmbio de mensagens viaja em alta velocidade e por distancias relativamente curtas. Para grandes distâncias, porém, a informação sobre um evento qualquer, que viaja no má­ximo à velocidade da luz, só é recebida momentos – ou mesmo anos – mais tarde.

A luz percorre cerca de 300 mil quilômetros em um se­gundo. Quando falamos ao telefone com alguém, mes­mo numa ligação interna­cional de “longa distância”, o sinal sai do aparelho, vai até uma central telefônica, e dela até um satélite a 36 mil quilômetros da Terra. O sinal retorna para a Terra e é captado por outra estação num país distante, que o re­transmite a outro aparelho telefônico, percorrendo ao todo cerca de 72 mil quilô­metros. Tudo isso demora 1/5 de um segundo, o que não é percebido pelos usuários de telefones, que conversam como se suas vozes fossem transmitidas instantaneamente. Mesmo numa comunicação com a Lua, os sinais de rádio de­moram pouco mais de dois segundos para ir e voltar, o que é per­ceptível mas não chega a sugerir aos interlocutores que eles estão diante de umas das limitações mais funda­mentais do Universo.

Ilusão Persistente

Para entender essa limitação à capa­cidade de comunicação no Universo, retornemos ao diálogo com o astro­nauta em Marte e investiguemos mais a fundo o que aconteceu. Sua voz, as­sim como sua imagem falando ao rá­dio, saíram de onde você estava e via­jaram em todas as direções na veloci­dade da luz. As ondas de luz (incluin­do sinais de rádio, que são uma forma de luz) deixaram a Terra e chegaram a Marte quatro minutos depois. Só en­tão o astronauta respondeu à sua sau­dação. A resposta dele demorou mais quatro minutos para retornar. Oito minutos depois de saudá-lo, você o viu respondendo. É interessante ima­ginarmos uma imagem que contém você fazendo a pergunta viajando en­tre a Terra e Marte, sendo por algum tempo ignorada pelo astronauta. Essa imagem constitui um momento no tempo, “carregado” pelos fótons (as partículas de luz) de um lugar a outro.

Estritamente falando, a sensação de que há um tempo presente em todo o Universo é uma ilusão. No exemplo aqui apresentado, nosso presente di­fere do vivido pelo astronauta. Quan­do o observamos agora, vemos o que ele estava fazendo alguns minutos atrás. Por isso ele parece não respon­der à saudação inicial. Porém, esse mesmo momento da sua saudação só será visto por ele alguns minutos adiante. Cada um observa o que o outro estava fazendo no passado. O que levanta uma questão interessan­te: existe uma maneira de calcular um “agora” universal? Por exemplo, supo­nha que comemos um chocolate en­quanto olhamos o astronauta desem­pacotar um instrumento científico. Quatro minutos depois, observamos que ele está instalando o instrumento no solo, e deduzimos que no mesmo instante em que comíamos o choco­late, o astronauta estava na verdade instalando o instrumento, e não o desempacotando. Assim, haveria um momento presente universal que po­deríamos computar se descontásse­mos os atrasos causados pela veloci­dade finita da luz.

Isso só aconteceria se todos os objetos do Universo mantives­sem suas posições relativas intactas: se as coisas não se movessem umas em relação às outras. Mas a teoria especial da relatividade, de Albert Einstein, mostrou que não é possível, nem em princípio, sincronizar nossos relógios com o de outra pessoa que esteja se movendo em relação a nós – nem mesmo se ela estiver passando ao nosso lado, em vez de se encontrar no distante planeta Marte. No dia a dia, julgamos poder sincronizar nos­so relógio com alguém passando de carro por nós. Porém, se tivéssemos relógios extremamente precisos verí­amos que seria impossível concordar com o motorista do carro sobre se duas coisas aconteceram ao mesmo tempo. Os efeitos da relatividade só são fáceis de notar a velocidades mui­to superiores às que estamos acostu­mados no dia a dia (ver “A Realidade não Percebida”, SCIENTIA, Edição 7). Se a velocidade da luz fosse infinita, haveria de fato um tempo universal, pois os atrasos descritos aqui não aconteceriam e todos os observado­res se veriam “em tempo real”, não importando a distância entre si. Mas esse não é o caso.

Mesmo assim, intuitivamente acre­ditamos que existe um “agora” em todo o cosmos; que o que acontece aqui pode basicamente ser visto ao mesmo tempo por qualquer um, in­dependentemente de sua localiza­ção no Universo. Como acabamos de ver, no dia a dia, temos essa impres­são porque as distâncias envolvidas em nossas comunicações são muito curtas. A luz chega quase instantane­amente a qualquer lugar, e as coisas parecem transcorrer “em tempo real”. Entretanto, como uma caravela, ainda que ultrarrápida, a luz demora para irde um lugar a outro. E o exemplo do astronauta nos mostra que, depois de alguns meses, quando Marte se afastou da Terra, o tempo de comu­nicação entre a Terra e Marte mudou para vinte minutos. Isso porque a luz passou a ter de percorrer uma distância maior (isso vale para qual­quer outra forma de transmissão de informação, já que nada viaja mais rápido que a luz. Ver quadro ao lado).

Imagine agora o que aconteceria se estivéssemos nos comunicando com alguém a uma distância muito maior que a do planeta Marte. Su­ponhamos que nosso interlocutor é um astronauta nas redondezas de Próxima Centauri. Depois de saudá­-lo, poderíamos esperar uma respos­ta não alguns minutos depois, mas sim oito anos mais tarde! Se hou­vesse um telescópio suficientemen­te potente, poderíamos observar o astronauta, mas veríamos o que ele estava fazendo há aproximadamente quatro anos. O mesmo pode ser dito sobre Próxima Centauri. A imagem da estrela que vemos hoje mostra na verdade como ela era há quatro anos.

Assim, quando olhamos para lon­ge, estamos olhando diretamente para o passado.

O Fim é o Começo

A profundidade desse passado au­menta com a distância. Quando ob­servamos o centro de nossa galáxia, a 30 mil anos-luz de nós (um ano-luz é a distância que a luz percorre em um ano, equivalente a 9,4 trilhões de quilômetros), estamos captando luz e informações que deixaram aquele local há 30 mil anos. Portanto, esta­mos vendo como o núcleo galáctico era 30 mil anos atrás. No caso de An­drômeda, vemos como esta galáxia era há 2,3 milhões de anos. E assim por diante: podemos ver como uma infinidade de galáxias era até bi­lhões de anos atrás.

A essa altura, talvez você esteja se perguntando se poderíamos obser­var objetos com trilhões de anos ou até mesmo infinitamente antigos. Em princípio, isso seria possível. Mas não vemos esses objetos. Eles não estão lá. O Universo parece chegar ao fim, depois de cerca de 14 bilhões de anos-luz (a estimativa mais recen­te é 13,7 bilhões, mas aqui arredon­damos este valor para 14 bilhões. Usamos esse número temporaria­mente. As distâncias envolvidas são maiores e veremos o motivo logo mais. A distância exata não é impor­tante para o presente raciocínio). Não se trata de uma limitação dos nossos telescópios atuais. Também não é o caso que a distância torne os objetos celestes “pequenos” ou “páli­dos” demais. Simplesmente, além de 14 bilhões de anos-luz não há mais galáxias. Podemos literalmente ver o fim ou a borda do mundo, por assim dizer. Depois dela, não há nada. Isso não significa, porém, que o Universo, além desses 14 bilhões de anos luz, se estende até o infinito num pro­fundo vácuo. Isso seria realmente es­tranho, pois implicaria que estamos no centro do mundo, cercados por uma esfera de galáxias com raio de 14 bilhões de anos-luz. Essa localização especial no cosmos contrariaria o princípio Copernicano, que diz, em suma, que nosso sistema solar e nossa galáxia são típicos no Universo e não pos­suem localização privilegiada no es­paço ou no tempo.

Para entendermos a causa deste li­mite cósmico, temos de levar o tem­po em consideração. Dizer que não há nada além de 14 bilhões de anos­-luz de distância é o mesmo que dizer que nada existia antes de 14 bilhões de anos atrás. Que o Universo iniciou­-se há 14 bilhões de anos.

Escuridão Noturna

Curiosamente, nunca foi necessário construir supertelescópios para de­duzir isso. O fato de o céu ser escuro à noite indica que o Universo não exis­tiu eternamente. Até o final dos anos 20, era consenso entre os astrônomos que o Universo sempre foi como é atualmente. Quando se olha para o céu plácido, parece razoável supor que o Universo é estático – infinito e infinitamente antigo. Porém, cerca de cem anos antes, Heinrich Olbers, um médico alemão e astrônomo amador, havia argumentado que num Univer­so infinito e eterno, para qualquer lado que se olhe, a linha de visada deveria terminar na superfície de uma estre­la. Num Universo infinito, deve haver uma quantidade infinita de espaço em torno de qualquer ponto. Podemos tomar qualquer local arbitrariamente e considerá-lo o “centro” do Universo. Se a matéria do Universo está distribu­ída uniformemente (o que é uma boa aproximação da realidade – dizemos que o Universo é isotrópico e homogê­neo, ou seja, para qualquer lado que olhemos, e independentemente de onde estejamos, ele parece igual), en­tão num Universo infinito não existiria nenhuma direção para onde olhás­semos sem encontrar uma estrela no caminho, pois haveria um número in­finito delas. Portanto, o céu noturno deveria ser tão brilhante quanto o Sol, o que contradiz o fato dele ser escuro.

Ou não deveria? Sabemos que o brilho e o calor das es­trelas diminui com a dis­tância. A escuridão do céu noturno poderia ser causada por esse efeito? Pelo fato de as estrelas estarem distantes demais de nós? Para entender porque esse não é o caso, é preciso se familiarizar com duas propriedades do espaço tridimensional. A primeira é que o brilho de um objeto diminui a uma taxa específica: o quadrado da distância entre nós e ele. Imagi­nemos duas estrelas de mesmo brilho: uma de­las distante dez anos luz e a outra localizada a 20 anos-luz. Para nós a se­gunda estrela teria um brilho aparente quatro vezes menor do que a pri­meira. Mas esta perda de brilho com a distância é exatamente compensada pela segunda proprieda­de: a uma distância duas vezes maior, o número de estrelas numa determinada área do céu também se torna quatro vezes maior. De forma que num Universo infinito, seria impossível olhar para qualquer direção sem que a super­fície de uma estrela fosse finalmente encontrada. Todas as direções se­riam brilhantes (ver quadro ao lado). A uma distância muito grande, o bri­lho das estrelas seria diminuto, mas seu número seria muito elevado.

Além disso, num Universo infinita­mente extenso e antigo, o brilho e o calor das estrelas já teriam tido tem­po para se distribuir uniformemente pelo espaço. O calor sempre “flui” de um lugar quente para lugares mais frios. Por exemplo, se adicionarmos gelo a uma xícara de água quente, depois de um tempo veremos que o gelo foi derretido pela água, que também esfriou. Uma temperatura de equilíbrio entre a do gelo e a da água é atingida no final. Esse fato é expresso na física pela segunda lei da termodinâmica. Da mesma forma, o calor das estrelas se dissipa o tempo todo para o espaço, que é muito frio. Um Universo infinitamente antigo já teria há muito atingido o equilíbrio termodinâmico e deveria estar uni­formemente “morno”. Não existiriam diferenças de temperatura entre es­paços vazios e estrelas.

Por que então o céu noturno não é incandescente? Três explicações vêm à mente: ou o Universo termina em algum lugar ou as estrelas não esti­veram brilhando sempre, não tendo tempo ainda para esquentar todo o céu. Ou ambas as coisas. A terceira explicação prevaleceu, por estar de acordo com a teoria do big bang, de­senvolvida no século XX. Porém, essa mesma teoria tornou a explicação incompleta. A história é mais com­plicada – e fascinante. Isso porque no paradoxo de Olbers supõe-se que vivemos num Universo estático. Esta suposição está incorreta.

Big Bang

Após 1915, ano da publicação da Te­oria da Relatividade Geral, de Albert Einstein, começaram a ser estudadas as implicações dessa ideia. Modelos matemáticos descreviam como a gra­vidade afetava o espaço, o tempo, a distribuição de matéria e energia no Universo como um todo. Em parti­cular, o físico russo Alexander Fried­mann chegou à conclusão de que as soluções das equações da relatividade geral apontavam para um Universo instável, que deveria estar aumentan­do ou diminuindo de tamanho. Como à época se acreditava que o Universo em larga escala era imutável, este re­sultado criou uma situação incômoda. O próprio Einstein, como resposta à idéia de que o Universo era instável, incorporou às suas equações uma “constante cosmológica”, que traria estabilidade ao Universo. Pouco tem­po depois, descobriu-se que o Univer­so inteiro estava de fato expandindo (ver “O Big Bang”, SCIENTIA, Edição 5), o que levou Einstein a classificar sua constante cosmológica como o maior erro de sua vida. (Ironicamente, sa­bemos hoje que Einstein não estava errado, afinal. A constante cosmoló­gica é tida como a provável causa da aceleração da expansão do Universo, descoberta no fim dos anos 90).

No começo do século XX, vários astrônomos, entre eles Vesto Slipher e James Keeler, des­cobriram que todas as galáxias, com ex­ceção de algumas mais próximas, esta­vam se afastando de nós. Essa descoberta foi possível graças a uma técnica chama­da espectroscopia, ou análise da luz. A luz branca é, na ver­dade, uma combi­nação de fótons de diversas energias, cada qual percebi­da por nós como uma determinada cor. Quando se jun­tam, essas luzes de diferentes energias são vistas como a cor branca. A espec­troscopia consiste em decompor a luz branca emitida por um objeto distante através de instru­mentos ópticos que revelam valiosos de­talhes sobre a fonte emissora desses fótons. É graças a essa técnica que podemos conhecer a composição química de objetos as­tronômicos que provavelmente nun­ca teremos a chance de visitar (ver quadro ao lado).

A análise da luz também permite saber se um objeto está se afastando ou se apro­ximando de nós. Quando um objeto se aproxima de nós, sua luz fica azu­lada. Objetos que se distanciam, por sua vez, sofrem um avermelhamento, apropriadamente chamado de des­vio para o vermelho. Inicialmente, os astrônomos pensaram que este des­vio para o vermelho era causado pelo chamado efeito Doppler. Apesar do nome obscuro, o efeito Doppler é um fenômeno familiar. Quando ouvimos o apito de um trem ou a sirene de uma ambulância em movimento mu­darem de tom, estamos presencian­do o efeito Doppler, um achatamento ou alongamento de ondas sonoras e luminosas causado pelo movimento (ver quadro ao lado).

 

Normalmente, não podemos notar o efeito Doppler da luz porque este é suave demais para ser percebido. Apenas objetos muito rápidos mudam sua cor de maneira apreciável. De qualquer for­ma, o importante a entender é que o efeito Doppler permite medir deslo­camentos no espaço. As galáxias se movimentam, mas elas o fazem em todas as direções. Então, porque a espectroscopia mostrava que todas elas estavam se afastando de nós?

Em 1929, o americano Edwin Hub­ble publicou resultados que causa­riam uma revolução e o tornariam o astrônomo mais famoso do século XX. À frente do telescópio Hooker, de 2,5 metros de diâmetro, no observatório de Mount Wilson, o maior do mun­do à época, Hubble e seu ajudante Milton Humason descobriram que o afastamento das galáxias seguia um padrão. Esse telescópio foi o primeiro a permitir que se identificassem estre­las variáveis em outras galáxias. Essas estrelas possuem um brilho intrínse­co conhecido. A comparação entre este brilho conhecido e o brilho ob­servado permite que se determine a que distância elas e as galáxias que as abrigam estão. Assim, Hubble e Hu­mason foram os primeiros a conseguir medir a distância até outras galáxias (isto, em si, já representou uma des­coberta momentosa; ver coluna “Re­voluções”, SCIENTIA, edição 3). Agora, combinando as medições de desvios para o vermelho realizadas por ou­tros astrônomos com suas próprias estimativas de distâncias, os dois as­trônomos encontraram uma relação entre a distância de uma galáxia e sua velocidade de afastamento. Havia um aumento de velocidade diretamente proporcional à distância até uma ga­láxia, e esse aumento foi calculado por Hubble. Imediatamente, dados aparentemente sem sentido torna­ram-se claros para os astrônomos (mesmo após os cálculos de Hubble passarem por drásticas correções nas décadas seguintes). Outra coisa, que não o efeito Doppler, estava geran­do a maior parte dos desvios para o vermelho observados. Tratava-se da expansão do espaço. Ao se propagar de uma galáxia para outra, um fóton é esticado ao longo do caminho, pelo aumento do próprio “tecido” do Uni­verso. Esse alongamento das ondas é semelhante ao provocado pelo mo­vimento, mas sua causa é completa­mente diferente.

As galáxias se movimentam para todos os lados no espaço, mas o pró­prio espaço se expande, e como essa expansão acontece em todo lugar, ela se acumula com a distância. O fato de quase todas as galáxias esta­rem se afastando pode dar, mais uma vez, a impressão de que estamos no centro do mundo, emitindo uma força repulsiva que aumenta com a distância. Na verdade, a expansão do espaço está por toda parte e de qual­quer galáxia pode-se ver quase todas as outras galáxias se afastando (ver quadro ao lado).

Se o Universo está ficando cada vez maior, isso implica que no passado ele foi muito pequeno. De fato, hoje os astrônomos afirmam confiantemen­te, com base em indícios numerosos e fortes, que há cerca de 14 bilhões de anos tudo o que há no Universo hoje estava agrupado num espaço extre­mamente reduzido, a uma tempera­tura de trilhões de graus (a unidade, Kelvin, Celsius ou Fahrenheit, real­mente não importa quando falamos em números tão altos). Esse corpo de teoria é conhecido como Big Bang. O Big Bang resolve parte do paradoxo de Olbers (não havia nada brilhando antes de 14 bilhões de anos), mas cria uma outra dificuldade. Os físicos cal­culam que houve uma época, apro­ximadamente 300 mil anos depois do Big Bang, em que todo o céu se tornou brilhante. Todo o espaço tinha um brilho comparável ao da super­fície das estrelas. Se todo o céu era incandescente e se, como vimos, a natureza do espaço permite que olhe­mos diretamente para o passado, por que então não vemos esse brilho até hoje? Como no paradoxo de Olbers, o big Bang parece implicar que o céu noturno não poderia ser escuro.

Paradoxos Resolvidos

O alongamento das ondas de luz é capaz de explicar porque o céu pa­rece escuro à noite – para os nossos sentidos, pelo menos. A luz emitida no período de brilho intenso do Uni­verso foi esticada até que suas ondas atingissem um comprimento corres­pondente a uma forma de radiação chamada microondas, conhecida principalmente por causa dos popu­lares fornos que utilizam esse tipo de energia. Diferentemente de um forno comum ou de fornos elétricos, que emitem luz visível sob a forma de cha­mas ou de ferro incandescente, fornos de microondas emitem uma radiação que o olho humano não consegue enxergar. Porém, microondas podem ser “vistas” por detectores apropria­dos. Nessa modalidade de luz, o céu está longe de ser escuro. Ele está re­pleto dessa radiação que não enxer­gamos. Assim, a causa da escuridão noturna – para nós – é a expansão do espaço e não o fato de o Universo ter tido um início no tempo. Com a tec­nologia atual, não é possível explorar distâncias além dessa cortina lumi­nosa em microondas, que forma o limite do “visível”. De qualquer modo, não haveria muito que ver, além de partículas elementares vagando sol­tas pelo espaço até o instante, pouco anterior à cortina, em que o Universo iniciou (os físicos, porém, dariam tudo para obter essa visão do Universo pri­mordial e estão se empenhando em construir telescópios que detectam ondas gravitacionais, para as quais a cortina é transparente). Não fosse pe­las microondas, este limite seria dado pela próprio surgimento do Universo, há 14 bilhões de anos. Além dessa “época”, não seria possível ver nada, pelo simples fato de que não haveria nada para ver.

O Tamanho do Universo

Como há uma relação entre a veloci­dade de afastamento de uma galáxia e sua distância, determinar o desvio para o vermelho no espectro de ga­láxias longínquas é uma forma de medir sua separação de nós. Ou seja, distâncias crescentes resultam em afastamentos mais rápidos, o que se traduz em maiores desvios para o ver­melho. De fato, os astrônomos prefer­em falar de desvios para o vermelho, ao invés de distâncias. Isso porque os primeiros podem ser medidos direta­mente, enquanto as últimas são calcu­ladas com base em estimativas da taxa de expansão do universo. Utilizando-se uma estimativa dessa velocidade de expansão e de como ela mudou ao longo da história (ela diminuiu, mas agora volta a aumentar (ver “Uni­verso Acelerado”, SCIENTIA, Edição 12), também é possível calcular, para cada desvio para o vermelho medido, há quanto tempo a luz de uma galáxia foi emitida. Por exemplo, um desvio para o vermelho igual a 0,06 (ondas 6% maiores que o normal) indica que a luz passou 800 milhões de anos via­jando até nós, enquanto um desvio de 1 (o dobro do comprimento normal) significa que a luz foi emitida há 7,7 bilhões de anos. Há pouco, ao discutir a aparente “borda” do Universo a 14 bilhões de anos-luz, eu ressalvei que a distância verdadeira é maior que essa. De fato, o Universo não contém nada mais antigo que 14 bilhões de anos. Mas para galáxias com um alto desvio para o vermelho, não se pode auto­maticamente transformar o tempo de viagem da luz numa distância em anos-luz. Isso poderia ser feito ape­nas se o Universo fosse estático, o que não não é o caso.

O que ocorre é que a cada milhão de anos-luz, a velocidade de expansão cósmica aumenta em cerca de 21,5 quilômetros por segundo (essa é a estimativa mais recente da constan­te de Hubble, ou a taxa de expan­são do Universo). Para uma galáxia próxima, como a do Sombreiro (ver figura ao lado), situada a “apenas” 30 milhões de anos luz (desvio= 0.003), esse aumento de velocidade não é importante. A diferença entre a dis­tância real da galáxia e a estimativa de quando a luz dela foi emitida é de somente cerca de 6 anos luz. Portan­to, grosso modo, é lícito dizer que a galáxia emitiu sua luz há 30 milhões de anos e que ela se situa a 30 mil­hões de anos-luz. Para galáxias dis­tantes, porém, a diferença se torna enorme. Uma galáxia com desvio de 4, que emitiu sua luz há 12 bilhões de anos, está hoje a mais de 23 bil­hões de anos-luz. Sua luz começou a viajar pelo cosmos quando ela es­tava a apenas 4,6 bilhões de anos-luz de nós e o universo tinha apenas 1,5 bilhões de anos. É interessante notar que a luz não passou 4,6 bilhões de anos viajando, mas 12 bilhões de anos, por causa da rápida expansão do universo. O fóton saído da galáxia teve de viajar uma dis­tancia muito maior do que ele teria de percor­rer se o universo não estivesse expandindo. A região do Universo que detectamos como microondas localiza-se hoje não a 14 bilhões, mas a cerca de 44,5 bilhões de anos-luz de nós. Quando sua luz foi emitida, ela estava mil vezes mais próxima, a 40 milhões de anos luz.

Aqui há uma aparente inconsistên­cia: como uma galáxia poderia estar a 4,6 bilhões de anos-luz quando o uni­verso tinha apenas 1,5 bilhão de anos? Isso implica que a galáxia estava se afastando a uma velocidade superior à da luz, que, dizem os físicos, nunca pode ser ultrapassada! Na verdade, as galáxias não estão se movendo no es­paço (não tão rápido, pelo menos). Seu afastamento não apresenta nenhuma contradição com a relatividade espe­cial, que demonstra que movimentos no espaço mais rápidos que a luz são impossíveis (ver “A Realidade não Per­cebida”, SCIENTIA, Edição 7). As galáx­ias distantes se afastam de nós mais rápido que a luz porque o próprio es­paço está expandindo. Nada impede que dois objetos em dois cantos dis­tintos do universo em expansão se af­astem mais rápido que a luz quando o próprio espaço está crescendo. Em liv­ros e artigos de popularização cientí­fica, este ponto é bastante confuso. A confusão acontece porque normal­mente quando se fala em desvio para o vermelho, não se leva em conta o fato de que o espaço expande. O des­vio para o vermelho do efeito Dop­pler não é idêntico ao causado pela expansão do espaço. Diversos autores afirmam que o esticamento das ondas de luz se torna praticamente infinito quando a velocidade de afastamento se aproxima da da luz. Isso não acon­tece. Objetos que se afastam de nós diversas vezes mais rápido que a luz são rotineiramente observados. Mes­mo assim, como vimos, é verdade que o desvio para o vermelho fica cada vez maior para objetos que emitiram sua luz perto de 14 bilhões de anos atrás, e se torna teoricamente infinito um pouco depois do início da radiação de microondas. Esse seria o verdadeiro limite do Universo? Não. Essa região de desvio para o vermelho tendendo ao infinito é chamada de horizonte de partículas. O horizonte de partícu­las marca o tamanho daquilo que os astrônomos chamam de universo observável, ou seja, as galáxias que podemos ver da Terra hoje porque sua luz teve tempo de nos atingir des­de o início da expansão do cosmos. Assim, o horizonte de partículas é a distância máxima que a luz conseguiu viajar desde que o Universo começou até hoje (ver quadro na pág. 30). Para todos os fins práticos, este horizonte atualmente estaria situado a cerca de 46 bilhões de anos-luz, portanto além da cortina de microondas. (A distância até o horizonte muda com o tempo e tem profundas implicações sobre o destino do Universo (ver “Triste Fim do Universo”, SCIENTIA, Edição 14, e “Uni­verso Acelerado”, SCIENTIA, Edição 12).

Para Sempre Inacessível

O termo universo observável implica a existência de regiões que não são observáveis; que o cosmos é maior do que aquilo que podemos ver dele. O tamanho do Universo não é limi­tado pelo que é observável. Existem regiões cuja imagem, desde que o Universo começou, nunca teve tempo de nos atingir. Um fato concreto ilus­tra muito bem isso: a foto que ilustra a primeira página deste artigo foi ti­rada pelo telescópio espacial Hubble em 1995. Chamada Campo Profundo Hubble Norte, ela mostra com clareza galáxias longínquas e revela alguns dos objetos mais distantes já vistos. Três anos depois, o Hubble obteve uma imagem semelhante, o Campo Profundo Hubble Sul, numa direção oposta à da sua correspondente ao norte. Nessas fotos, há alguns pontos minúsculos avermelhados. Esses pon­tos são galáxias muito afastadas, com um desvio para o vermelho elevado. Elas estão próximas do limite do que para nós é o universo observável. Do ponto de vista de qualquer uma des­sas galáxias, nós é que estamos próxi­mos do seu limite observável. Nós as vemos como elas eram há 11 ou 12 bilhões de anos. Eles vêm a imagem de nossa galáxia ainda jovem, com 2 ou 3 bilhões de anos de idade. Para o lado Sul, a situação é a mesma. Algu­mas galáxias estão próximas ao nosso horizonte, o que significa que nossa galáxia está próxima ao horizonte de­las. Agora vem a parte surpreendente: como as galáxias em ambos os lados estão próximas ao nosso horizonte, as localizadas ao sul estão além do horizonte das que estão ao norte, e vice-versa (ver quadro ao lado). Uma região não consegue ver a outra. Para um dos lados, é impossível saber qualquer coisa sobre o outro lado. Isso demonstra, de maneira simples, que o Universo é maior do que consegui­mos ver. Assim como vemos galáxias que estão fora do horizonte do Cam­po Profundo Norte, provavelmente há regiões vastas do Universo fora do nosso próprio horizonte. O Universo pode muito bem ser infinito, e para todo o sempre conheceremos uma minúscula região dele (que para nós parece imensa).

Em cosmologia, há uma teoria que descreve a expansão do Universo nos seus primeiros momentos, a chama­da Inflação. A Inflação prevê que o Universo é muito maior do que aquilo que podemos ver. Embora nunca pos­samos provar isso diretamente, nem saber o tamanho real do Universo que está fora de nosso horizonte, existem diversas evidências que apoiam o mo­delo inflacionário, a ponto dele ser o mais disseminado entre os cosmólo­gos (ver “O ‘Bang’ do Big Bang, SCIENTIA, Edição 9).

Brooklyn Não Expande

A expansão do Universo tem algum efeito direto sobre nós? No filme An­nie Hall, de Woody Allen, o garoto Alvy Singer é levado a um psiquiatra. Ao ser perguntado sobre o motivo de sua depressão, ele responde: “O universo está expandindo. O Univer­so é tudo, e se ele está expandindo, algum dia todas as coisas irão se des­pedaçar e será o fim de tudo”. Sua mãe intervém: “Por que você se pre­ocupa com isso?” E, para o psiquiatra, ela relata: “Ele deixou de fazer a lição de casa”. O menino indaga: “De que adianta?” Impaciente, a mãe respon­de: “O que o Universo tem a ver com isso? Você está aqui no Brooklyn. O Brooklyn não está expandindo!” O psiquiatra, então, recomenda que o garoto aproveite a vida porque ainda vai demorar bilhões de anos até que o mundo acabe. É verdade que o uni­verso terá um melancólico fim daqui a trilhões de anos, e pode-se encarar essa questão com pessimismo, como o garoto, ou com otimismo, como o médico. Porém, a mãe de Alvy está absolutamente certa. O Brooklyn, nosso planeta, nosso sistema solar e mesmo nossa galáxia não estão ex­pandindo. Esses objetos mantêm-se coesos, seja pela atração entre seus átomos, seja por estarem presos um ao outro pela gravidade.

Daqui da Terra, podemos apenas nos maravilhar com a imensidão cósmica e com nossa pequenez diante do Uni­verso. Esse conhecimento só foi reve­lado pela ciência há algumas décadas. Duda, meu companheiro do início des­ta história, sem dúvida perdeu muito ao ignorar tais fatos. Compreendê-los pode não mudar nada no Brooklyn ou no nosso dia a dia. Mas nos deixa orgu­lhosos da capacidade humana de des­vendar tantas coisas surpreendentes sobre o mundo. Gradualmente, a ciên­cia nos livra de séculos de superstição. E nos torna melhores por isso.

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Eventos

APLICAÇÕES DA NANOTECNOLOGIA EM MEDICINA: NOVOS SISTEMAS PARA DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO
Palestrante: Prof. Dr. Valtencir Zucolotto
Laboratório de Nanomedicina e Nanotoxicologia IFSC - USP
Data: 08.03.2012
Horário: 16:00h
Transmissão via Internet (iptv.usp.br)
Entrada franca
Local: Auditório Abrahão de Moraes - Instituto de Física da USP

Neste colóquio será abordado o estudo de interações entre  nanopartículas poliméricas e metálicas com biomoléculas (proteínas,  anticorpos, membranas e células), com ênfase no potencial destes nanobiocompósios para o diagnóstico e tratamento de doenças, incluindo  doenças infecciosas e câncer.


FÍSICA NA CULTURA - “O PRÊMIO NOBEL DE 2011 E A EXPANSÃO ACELERADA DO UNIVERSO.”
Palestrante: THAISA STORCHI BERGMANN
Data: quinta-feira, 15 de março às 19:30.
Local: Livraria Cultura
Bourbon Shopping Country - Av. Túlio de Rose, 80 - Passo DAreia
Porto Alegre - RS